LEGALIDADE
DA TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRA OU JUROS DE OBRA.
Para
entender melhor sobre a validade ou não da taxa de evolução de obras,
primeiramente é necessário lembrar algumas regras atinentes aos contratos.
Sabendo
que o contrato é negócio jurídico e como tal é feito de regras, torna-se
evidente que, para terem validade em um contrato, as cláusulas devem estar em
compasso com normas que balizam a convivência social.
Quando
falamos da legalidade da Taxa de Evolução estamos nos referindo a validade
dessa Taxa dentro de um contrato, ou seja, analisamos se a cláusula contratual
que dispõe sobre a Taxa de Evolução de Obras é legal ou ilegal naquele contexto.
Partindo
desse pressuposto e sabendo que todo contrato tem uma função social, e mais,
que se trata de importante instrumento capaz de fazer Lei entre as partes, é
salutar que este instrumento siga o que preceitua o ordenamento jurídico, dentro
do papel social, ao contrário se teria um instrumento anulável.
Sabendo
que, a rigor, todo contrato expressa a vontade de duas partes, nada mais
correto do que cumprirem com aquilo que acordaram entre si. Contudo, há tempos,
o brocado jurídico; “pactuou tem que cumprir” (pacta sunt servanda) foi mitigado, sobretudo, pelo advento da
Constituição de 1988, podendo todo e qualquer contrato ser revisto pelo poder
judiciário, desde que lese ou ameace direitos justapostos.
Observe-se
que, com a vinda das garantias constitucionais, como dignidade da pessoa humana
e direitos de personalidade, e até mesmo com a chegada de Leis regulamentadoras,
como o Código de Defesa do Consumidor, não há mais espaço para contratos que
tragam prejuízos extremos a uma parte em detrimento ou em enriquecimento da
outra, tendo o Estado que primar sempre pelo equilíbrio contratual.
Dito
isso, vem a celeuma: Sabendo que taxa de Evolução de Obra nada mais é do que
juros cobrados pelo banco em decorrência do empréstimo feito por ele à
construtora para financiamento da obra, é mais que razoável que o repasse dessa
Taxa ao consumidor seja injusta, pois ele acaba rateando compulsoriamente uma
Taxa que em tese é exclusiva da construtora. Talvez seja por esse motivo que
geralmente ela é introduzida ao contrato de forma escusa.
Em
outras palavras, o banco empresta o dinheiro à construtora exigindo desta o
pagamento de Juros de Evolução de Obra, que, por sua vez, são repassados aos
compradores quando estes assinam o contrato para o financiamento bancário.
A
astúcia dos Grupos está aí. Após o comprador finalizar o “financiamento com a
construtora” (pagar entrada, corretagem, balões e parcelas), aguardando ansioso
a entrega das chaves, faltando apenas assinar seu financiamento imobiliário.
Nessa hora, o próprio Banco (que geralmente é financiador da obra) embute a
Taxa de Evolução no contrato de financiamento. Isso faz com que, ainda que o
comprador não aceite a inclusão de tal Taxa, seja condicionado a assinar o
contrato de financiamento, sob pena de não conseguir o crédito, ficar
inadimplente no contrato e não conseguir as chaves, ou seja, perder o imóvel
pronto, que já achava ser seu.
Daí, decorre
a primeira ilegalidade da Taxa: Falta de clareza em sua cobrança. Essa
obscuridade afronta as garantias de direito, especialmente a lei consumista,
sobretudo, quando determina que o Consumidor deverá ter informações precisas
acerca daquilo que está adquirindo, não podendo ser “surpreendido” com cobranças
das quais desconhecia. A exemplo do que acontece na espécie, quando falamos da Taxa
de Evolução de Obra.
Ressalte
que o instituto da Evolução de Obra ou Juros de Obra fora criado para evitar
que as construtoras atrasem a entrega das obras. Assim, cessada a obra ou
chegada a fase de entrega das chaves, a taxa não mais poderá ser exigida do
comprador, recaindo sobre a construtora os prejuízos pelo não cumprimento do
cronograma de obras. Entretanto, na prática, não é isso que acontece, vemos que
mesmo com atraso na entrega, as vezes em fase de habite-se, ainda se continua a
cobrança da famigerada Taxa de Evolução, a pretexto de força contratual.
Disso
que foi dito, se percebe que essa cláusula, embutida atualmente em praticamente
todos os contratos de promessa de compra e venda, não é obrigatória, ou pelo
menos não haveria de ser, podendo “ser questionada” na hora da compra, até
antes da assinatura do contrato de promessa de compra e venda. Todavia, sabemos
que na prática não se consegue o financiamento sem a adesão a esta Taxa abusiva,
o que faz dela uma armadilha ilegal.
Com
efeito, uma vez contratada a cláusula de evolução, apenas poderá ser afastada
por aditivo contratual, ou pelo judiciário por provocação das partes. Nessa
linha, o Judiciário vem entendendo que a Taxa se torna ilegal a partir da
finalização da obra, ou do fim do prazo para entrega das chaves, o que - para
nós que defendemos a ilegalidade total da Taxa - já é um avanço.
Vejamos
o que entende o Tribunal de Justiça de Minas Gerais a respeito do tema:
APELAÇÃO
CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA C/C REPARAÇÃO DE DANOS - CONTRATO DE COMPROMISSO DE
COMPRA E VENDA- BEM IMÓVEL - DESCUMPRIMENTO - TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRA -
PAGAMENTO APÓS A ENTREGA DAS CHAVES - ATRASO NA ENTREGA DO
"HABITE-SE"- RESSARCIMENTO DEVIDO - RECURSO PROVIDO. Caso a
construtora proceda à entrega do imóvel sem providenciar a tempo e modo a
certidão de "habite-se", deve ressarcir a parte autora pelos valores
efetivamente pagos a título de taxa de evolução da obra até a entrega do
referido documento, tendo em vista a comprovação de sua mora. (Apelação Cível
1.0024.11.280923-1/001, Relator (a): Des.(a) Wanderley Paiva, 11ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento em 05/06/2014, publicação da sumula em 10/06/2014)
APELAÇÃO
CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA. COBRANÇA
EFETIVADA PELO AGENTE FINANCEIRO. CONSTRUTORA. ATRASO NA ENTREGA DO
"HABITE-SE". DANO MATERIAL COMPROVADO. RESSARCIMENTO. NECESSIDADE.
INTERPRETAÇÃO CONTRATUAL. DIVERGÊNCIA. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. 1) A taxa
de evolução da obra é cobrada do mutuário pelo agente financeiro desde o início
da construção do empreendimento até a efetivação do contrato de financiamento,
o que somente ocorre após a expedição da certidão de "habite-se".
Assim, a construtora que entrega o imóvel sem providenciar a tempo e modo a
referida certidão, impossibilitando a celebração do contrato de financiamento,
deve ressarcir o mutuário pelos valores pagos a título de taxa de evolução da
obra no período compreendido entre a entrega das chaves e a emissão do
"habite-se". (...)(TJMG – Processo nº 1.0024.12.026774-5/001 -
Relator: Des. Marcos Lincoln – Data da publicação: 19/11/2013)
Logo,
se o consumidor realizou a compra de um imóvel na planta, e somente após
assinatura do contrato de financiamento percebeu a previsão de Clausula de
Evolução de Obra, é importante que acione o judiciário, requerendo a suspensão
da referida Taxa até o fim do processo. Comprovado, todavia, o abuso ou
qualquer outra disfunção no contrato, bem como atraso na entrega das chaves ou
do habite-se, o Consumidor terá direito de não mais pagar a Taxa e ainda
receber em dobro aquilo que pagou a título de Taxa de Evolução, por aplicação
do artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor.
Por
fim, vê-se que a Taxa de Evolução de Obra não está estritamente ligada, como
indica seu nome, à construção em si da obra, mais sim a uma manobra perspicaz,
utilizada pelas construtoras e bancos, para repassar ao Consumidor Juros do
negócio por eles entabulado.
Resta
refletir, se essa política financeira dos Juros se coaduna com o Estado
Democrático de Direito ao qual pretendemos. Ao nosso sentir a resposta é
negativa. Trata-se da manutenção do mesmo capitalismo colonial, assimilado de
forma destrutiva capaz de transfigurar até mesmo boas ideias, a exemplo do que
ocorreu com as minadas Políticas de Habitação, não apenas no Brasil, mas em
todo o Mundo que segue esse modelo de “crescimento”, pseudodemocrático.
Saulo Veríssimo
advogado
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